Crônica do Ignácio Loyola, lembrando com carinho da
Flipiri e da Íris, publicada hoje no Estado de São Paulo.
Copa e os tons de
cinza do Brasil
Na
minha idade, segui muitas Copas do mundo com entusiasmo e alegria, participando
da corrente geral que tomava o País e nos fazia rir, nos fazia crer, nos fazia
torcer. Não me lembro de 1954, mas de 1958 em diante, repórter geral, aderi ao
entusiasmo que coloria e arrastava o Brasil de ponta a ponta na época da Copa.
Meses de risos, otimismo, ironias, brincadeiras. Quase na véspera então, fosse
onde fosse, as janelas se tornavam verde-amarelas, ruas e muros pintados,
grafites por toda a parte, faixas imensas desciam do alto dos edifícios,
bandeirinhas nos carros, banners por toda a parte. Havia apostas, farras nos
bares, bons compositores criavam hinos louvatórios. Muita gente ainda canta
"pra frente Brasil, salve a seleção". Ainda canta os "milhões em
ação, salve a seleção". E são refrões de 40 anos atrás, quando havia
ditadura. Onde está a música desta Copa? Até agora, ouvimos canção oficial da
Fifa, chocha, tola, sem pegar nos nervos. Lembram-se das notícias mostrando o
povo correndo para comprar televisores? O povo corria às lojas, era um tsunami.
Os estoques se acabavam. Não vi nada até este momento, os televisores estão à
espera de compradores.
Agora,
é democracia, os jogos serão aqui, e o que vejo é um Brasil furioso, raivoso,
irritado, desesperançado, arrasado, colérico, ressentido, zangado, magoado,
amuado, com dentes cerrados. Não se fala nos jogos, nos adversários, não se
aposta em quem vai ser campeão. A maior parte da estrutura está inacabada.
Junte-se a isso uma epidemia de dengue e o ministro da Saúde desaparecido.
Claro, aprendeu com Lula, não sei de nada, não vi nada, não ouvi nada.
Melancolia. Concordo que os protestos deveriam ter sido sete anos atrás quando
se decidiu que a Copa seria aqui, para glória de Lula Supremo, o rei sol. O
povo não tem pão, saúde, educação? Que coma brioches, então! Vi pelos
telejornais um fato meio ridículo. A discussão se vai ser feriado ou não nos
dias de jogo. Há capitais e municípios querendo votar leis. Porque se for
feriado, terá de ser por lei votada pelas Câmaras. Coisa de gente que parece
não conhecer o Brasil, a história, o nosso povo. Acaso nas últimas copas alguém
decretou feriado? Acaso alguém, nos dias de jogo, foi trabalhar? Algum caxias
(neste caso não sei se devo escrever com C maiúsculo ou minúsculo. Socorro
Pasquale Cipro Neto), algum puxa-saco, alguém brigado com a mulher foi ou vai
trabalhar em dia de jogo? Alguém trabalha no carnaval? Vá, vá, vá, como dizia
minha avó Branca, quando queria desdenhar de alguma coisa. Copa é igual
carnaval, agente entrega a Deus.
Ou
será que é um pouco cedo? A festa vai contagiar? Nunca uma seleção teve a
obrigação de ganhar como agora. Que Santo Expedito e São Judas Tadeu, patronos
das causas impossíveis, zelem por nós. Faltam alguns dias. Que tudo dê certo e
que a gente ganhe o caneco, como se dizia antigamente. Mesmo sem o fervor, o
entusiasmo, a loucura, a farra. O Brasil está cinzento, todo mundo estourando
por dá cá aquela palha Brasil. Estamos iguais à Rússia e Ucrânia, dentes de
fora.
Ocupei
espaço com a desesperança e o abatimento, quando queria falar muito da Flipiri,
a sexta festa Literária de Pirenópolis, em Goiás. Já firmada no calendário
cultural. Ainda farei isso, porque muita coisa boa acontece lá, envolvendo toda
a cidade, todas as escolas, todos os professores. Flipiri e a Jornada de Passo
Fundo são exemplos de como essas semanas têm o pé na realidade e na necessidade
de formar leitores. Eles envolvem alunos do Fundamental para cima. Em
Pirenópolis, foram recebidos com alegria 60 escritores, contadores de
histórias, músicos, dançarinos. Quero falar de íris Borges, sonhadora,
idealista, pragmática, um "trator" que move céus e terras e realiza a
Flipiri, ano a ano, com uma verba mínima de algumas poucas centenas de milhares
de reais. Milagre, milagre, digo cada vez que vou lá e vejo o resultado.
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