sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Irmãos mais que irmãos









Se buscarmos no dicionário o significado de “irmão”, vamos encontrar, dentre outras, a seguinte definição: “aquele que, em relação a outrem, é filho do mesmo pai e/ou da mesma mãe.”

Em outra definição, na Internet, temos: Irmão ou irmã (do latím germanum) aquele que é filho do mesmo pai e da mesma mãe, ou só filho do mesmo pai ou só filho da mesma mãe, biológica ou adotiva. Pode-se chamar de irmão também aquele com quem se tem laço forte de amizade, tendo o mesmo significado de amigo.

No entanto, sabe-se que existem várias amizades que se formam por afinidades outras que não a biológica: irmãos de fé, irmãos de escola, irmãos de profissão e tantas denominações para pessoas que se ligam por afeto ou por serem espíritos afins.

Muitas vezes observamos irmãos consanguíneos que nada mais são que inimigos, desde a mais tenra idade. Não se afinizam em nada, não se suportam e desenvolvem, um em relação ao outro, sentimentos destruidores de ciúmes, raiva, despeito e inimizade. São relações que melhoram ou pioram no decorrer de uma existência.

Mas, há irmãos que são unidos por sentimentos de amizade, de amor, de fraternidade, de carinho, de cuidado, de proteção, enfim, se completam de tal forma que parecem almas gêmeas.

Tenho uma sobrinha (filha de meu irmão Tonho e de Olímpia Pacheco) que mora em Roma, casada com um romano  e que tem um casal de filhos; Matteo, de 7 anos e Chloe, de 5 anos. Em 2013, passei duas semanas com eles.

A princípio, fiquei encantada com as crianças porque tinha que me comunicar com elas em italiano, vez que não tinham domínio completo da língua portuguesa. E era uma oportunidade de treinar meu italiano.  Passado o primeiro impacto, comecei a observar cada um de per si.

O menino, uma figurinha centrada, de uma doçura traduzida nos menores gestos, observadora, olhos curiosos para observar o mundo, atento a tudo que se passava a sua volta e sempre com uma observação sobre que fazíamos, o que falávamos, o que vestíamos, como nos comportávamos.

Ano passado recebi a notícia de que Matteo passara de ano na escola.. E ele, todo sorridente e orgulhoso exibia seu Diplominha.

A menina, vaidosa, de uma vivacidade ímpar, daquelas crianças que abarcam a vida com o olhar, que sabe-se envolvente e que se ajusta muitíssimo bem no papel de princesinha da família.. A Chloe era o reloginho da casa. Ela já acordava ranhetando, por vezes chorando, e o pai sempre conversando com ela, para acalmá-la. Vez por outra, ela perguntava:

- Papà, io sono bella? (Papai, eu sou bonita?

- Sì, Chloe, tu sei tropo bella! (Sim, Chloe, você é muito bonita!)

E ela, sorridente, começava a  se aprontar para ir à escola.

Contudo, o que mais me encantou foi o relacionamento dos dois. O Matteo tem pela irmã um carinho enorme, gigante. Ele tem sempre aquele ar protetor e quando a abraça, parece dizer-lhe que estará sempre junto dela e que não há o que temer. Isso acontece todos os dias, a toda hora. Chloe, por sua vez, recebe tudo com uma naturalidade incrível e, às vezes, até abusa desse seu anjo protetor.

Certa vez, estavam os dois jogando no tablete e, numa das jogadas (era a vez do Matteo), a Chloe queria continuar jogando. E eu disse-lhe que a vez era do irmão e não a dela.  Daí o Matteo consertou a situação:

“ Aspetta. Prima la principessa; dopo, il principe.” (Espere. Primeiro a princesa; depois, o príncipe.)

            Passei um bom tempo refletindo sobre o que ouvira de um menino de 6 anos.

E era sempre assim. Tudo de uma forma natural e simples.

Na hora de contar histórias (O Matteo corrigia meus erros de italiano), ele sempre me pedia para trocar o nome da personagem principal pelo nome da irmã; e aí, ele, invariavelmente, a colocava em situação de perigo para que pudesse salvá-la.

Como toda criança normal, Matteo , uma ou outra vez, perdia a calma com a Chloe. Certa feita, ele irritou-se, pegou a mão dela e bateu-a com força sobre a mesa. Foi um chororô de todo tamanho. Advertido severamente pela mãe, Matteo caiu num choro sentido por ter tratado mal a irmã.

Eles tinham álbuns de figurinhas e nós (eu e minha sobrinha Liana) sempre trazíamos pacotes de figurinhas para os dois. Quando entregávamos os pacotinhos dele, logo vinha a pergunta:

“E per Chloe? Dov’è i pacchi dela mia sorella?” (E para a Chloe? Onde estão os pacotes da minha irmã?)

Em verdade, são duas crianças amorosas, disciplinadas e felizes. Isso se deve ao relacionamento harmônico e amoroso  de uma família, cujos pais se relacionam com os filhos com muito amor, carinho, respeito  e  exercício de  limites.

Uma noite, ao jantar, Chloe estava impossível: descia da cadeira, rodava pela sala; o pai chamava-a para jantar e ela só obedecia quando ele falava: “Chloe, uno, duo... antes do “tre” ela pulava lépida e fagueira para a cadeira e jantava quietinha. Mas, então, o Matteo que estava muito cansado (tinha tido escola em tempo integral  mais aula de natação) começou a fazer birra por nem sei o quê. O pai, já estressado, falou-lhe rispidamente. O menino virou-se para o pai, chorando e disse-lhe bem alto: “ Pazienza!”  Ficamos todos em silêncio. O pai, olhos cheios d’água, abraça o filho e pede perdão. Amor puro!

Aproveitando nossa estada, colocamo-nos (eu e Liana)  à disposição do casal para ficarmos com as crianças, enquanto eles iam assistir a um show da Marisa Monte que se apresentava em Roma. Na véspera, havíamos comprado dois livros para ler com eles. Tudo esquematizado: horário de jantar, de brincar e, em seguida, de dormir. O casal saiu, feliz da vida, e nós, após o jantar, brincamos com eles, contamos histórias e, às 21h, dissemos: “Agora, hora de dormir”.

Os dois arrumaram tudo, correram para o quarto, tiraram as roupas, colocaram os pijamas  e foram ao banheiro escovar os dentes. Ele coloca pasta na escova da irmã, os dois fazem a escovação e, logo após, ele vai inspecionar os dentes da Chloe para verificar se não tem “lodinho”.

Ato contínuo, foram cada um para sua caminha, puxaram os edredons, apagaram as luzes  e... silêncio total.

Eu nunca tinha visto nada igual.

E aquele pequeno tempo de convivência com essas crianças levaram-me a uma reflexão mais profunda sobre irmandade, solidariedade, carinho, companheirismo e amor.

Irmãos, mais que irmãos!

 

 

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